ARTE E DIVERSIDADE
Dimensões da Sexualidade
Identidade e Diversidade Sexual
Os meses de maio e junho têm datas relevantes voltadas para a população LGBTQIA+. O dia 17 de maio é marcado como o Dia Internacional de Luta contra a LGBTfobia. Já em 28 de junho, celebra-se o Dia Internacional do Orgulho LGBTQIA+. Movimentos sociais, instituições governamentais, empresas privadas e a sociedade civil têm se organizado nesse período para reafirmarem sua posição de luta por respeito e cidadania.
Nonato Ribeiro
Nonato Ribeiro [@nonatobiblio] Bibliotecário, leitor, nordestino e gay! Doutor em Ciência da Informação com interesse nas temáticas Informação e Diversidade sexual, Competência em Informação e Bibliotecas Universitárias.
Para adentrarmos nesse cenário, seja você LGBTQIA+ ou não, é necessário a compreensão da sexualidade humana e da diversidade sexual, sem desconsiderarmos a dimensão biológica, mas incluindo outros fatores como a cultura e a identidade. De acordo com o documento Elaborando Definições de Saúde Sexual, da Organização Mundial da Saúde (2002):
A sexualidade é um aspecto central do ser humano ao longo da sua vida e engloba sexo, identidade e papel de gênero, orientação sexual, erotismo, prazer, intimidade e reprodução. A sexualidade é vivida e expressada em pensamentos, fantasias, desejos, crenças, atitudes, valores, comportamentos, práticas, papéis e relacionamentos. A sexualidade pode envolver todas estas dimensões, mas nem sempre todas são vivenciadas ou expressas. A sexualidade é influenciada por uma interação de fatores de ordem biológica, psicológica, social, econômica, política, cultural, ética, legal, histórica, religiosa e espiritual.
Portanto, a partir desses conceitos, entendemos que a sexualidade humana extrapola o ato sexual biológico, envolvendo várias outras dimensões: desejos, sensações, comportamentos, fantasias, emoções, identidade. Da mesma forma como o gênero, a sexualidade também envolve um processo contínuo de construção da identidade humana pessoal, que acontece dentro de um contexto histórico, social e cultural específicos.
Segundo o senso comum heteronormativo, o ‘normal’ é que ao nascermos com pênis e vagina, somos determinados como homem e mulher, respectivamente. O homem deve desejar a mulher e a mulher, o homem, devendo se unirem em casamento, formar família, procriar e povoar a sociedade.
Contudo, os estudos sobre gênero e sexualidade vêm para romper com o paradigma da heteronormatividade, reconhecendo que as pessoas nascem com determinadas capacidades biológicas (cromossomos, genitálias, gônadas, hormônios) que os classificam como macho e fêmea, mas que seu papel social, sua sexualidade e sua identidade de gênero não são imutáveis e cristalizadas, mas se constroem ao longo da vida. Nesse ponto já cabe um adendo para incluir no debate sobre a divisão biológica das pessoas intersexuais, que nascem com características biológicas externas e/ou internas, que não se encaixam no padrão homem macho/mulher fêmea.
Já a orientação sexual envolve um padrão de atração sexual, emocional e afetiva para um grupo com determinado sexo biológico, não se constituindo em uma opção livre e voluntária*. Padronizou-se em quatro os tipos principais de orientação sexual:
a)Heterossexualidade (atração afetiva e/ou sexual por pessoas de sexo oposto);
b)Homossexualidade (atração afetiva e/ou sexual por pessoas do mesmo sexo);
c)Bissexualidade (atração afetiva, sexual e erótica tanto por pessoas do mesmo sexo quanto pelo sexo oposto); e
d)Assexualidade (que na realidade, referese à ausência de atração sexual).
Ademais, como mencionado anteriormente, para além de qualquer tipologia ou classificação, a sexualidade humana é heterogênea, não é imutável, sendo formada por uma multiplicidade de possibilidades. Assim, surgem novas formas de classificação, como a Pansexualidade (orientação sexual caracterizada pela atração sexual ou romântica por outras pessoas, independentemente do sexo e gênero destas), a Demisexualidade (atração sexual apenas em alguns casos em que anteriormente se estabeleceu um forte vínculo emocional ou íntimo) e a Autosexualidade (Atração que se sente por si mesmo), para citar algumas. É importante destacar também que a divisão principal de orientação sexual, entre hetero, homo, bi e assexual trata-se de uma classificação, criada para controle da sexualidade humana, sendo, portanto, arbitrária.
Quanto à identidade de gênero, diz respeito ao modo como a pessoa se percebe e se expressa individual e socialmente, seja homem ou mulher, independente ou não de sua anatomia. São três grupos principais:
a)Cisgêneros, as pessoas que se identificam e se comportam conforme o seu sexo biológico;
b)Transgêneros, são as pessoas que se identificam com um gênero diferente daquele que lhe foi atribuído no nascimento; e
c)Não-binários, que se referem às pessoas que questionam e transitam entre os gêneros e os papéis sociais que lhe são atribuídos.
Queremos ressaltar novamente que trata-se de uma classificação criada para fins de controle e entendimento, mas o gênero e a sexualidade ultrapassam as barreiras que a classificação impõe. Por exemplo, a palavra “transgênero” e sua forma abreviada, “trans”, podem ser utilizadas para reunir, numa só categoria, travestis e transexuais, referindo-se aos sujeitos que transitam entre um gênero e outro.
As travestis vivem cotidianamente sua identidade de gênero feminina, mas de maneira geral, não sentem desconforto com sua anatomia, ou não possuem a necessidade de fazer a cirurgia de redesignação sexual. Já pessoas transexuais geralmente sentem uma inadaptação ao seu corpo, possuindo o desejo de encaminhar um tratamento hormonal ou mesmo cirurgia de redesignação para alcançar o corpo referente ao sexo com que se identifica (BENTO, 2017).
Temos ainda outros grupos sociais ligados à identidade de gênero, como por exemplo: Crossdresser: pessoa que gosta de usar ocasionalmente roupas características do gênero oposto, geralmente em ocasiões específicas. Drag queen: homens que se vestem como mulher de maneira caricata com o intuito de realizar performances artísticas, que incluem canto e dança. Drag king: mulheres que se vestem como homem de maneira caricata com o intuito de realizar performances artísticas, que incluem canto e dança.
O sexo biológico, a orientação sexual, a identidade de gênero e a expressão de gênero podem estar relacionados, mas também são dimensões distintas da identidade humana, conforme visualizado na Figura.
Por exemplo, ser homossexual não necessariamente deve fazer um homem se sentir e se expressar menos masculino, ou uma mulher menos feminina. Outro caso, é que uma mulher transexual (que nasceu com genitais masculinos, mas assumiu uma identidade de gênero feminina), quando se relaciona com homens, é heterossexual, e caso se relacione com mulheres, é homossexual.
Por oportuno, lembramos que todas essas identidades e orientações não são rígidas ao longo da vida, podem mudar ao longo do tempo, permitindo que as pessoas vivam sua sexualidade e sua identidade como elementos fluídos, menos sujeitos a restrições e classificações.
Importante compreender todas essas dimensões da sexualidade e identidade humana, diante do cenário mundial de retrocessos em Direitos Humanos e o avanço do conservadorismo. Compreendemos também o papel da Ciência, da Cultura e da Arte e das bibliotecas na problematização da temática e apropriação dos espaços sociais.