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CINECLUBE

Chappie

Uma mistura de discussão sobre inteligência artificial, violência urbana e desenvolvimento cognitivo num "thriller" policial cibernético.

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David Leão

David Leão [@davidleao_av]: Formado em Cinema e em Eletrônica, apesar de não ter terminado o curso de Artes Visuais, se interessa por fotografia robótica e por artes digitais. Sonha em ser músico e ou crítico de cinema, um dia...

   A forma que o diretor sul-africano Neil Blomkamp utilizou para realizar essa polifonia, sobre temas bastante discutidos, atualmente, em "Chappie" foi no entanto bastante conhecida no cinema. Gerar identificação com um personagem protagonista.

   Neste filme, além do tratamento a partir desse ponto de vista nos identificamos com o robô policial Chappie por que o diretor tratou a construção do personagem assemelhando seu comportamento ao de uma criança em desenvolvimento e nos fazendo acompanhar esse processo que é sempre doloroso para nós.

   É um filme estadunidense lançado em 2015. A trama é ambientada na periferia da capital sul-africana Johannesburgo. Chappie é a unidade 22 de uma força policial robótica de inteligência autônoma produzida pela empresa Teravaal (o nome dessa empresa é homônimo ao título do curta-metragem do diretor que serviu como base para a produção do roteiro de "Chappie").

   Analisaremos um trecho que tem início aos 37’17” e vai até os 49’26”, tem duração de 12’09” no filme.

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   A escolha desse trecho deve-se ao caráter de equilíbrio dinâmico em que os temas de inteligência artificial, violência urban e desenvolvimento cognitivo são explorados.

   Vincent Moore (Hugh Jackman) chega sorrateiramente até a fábrica abandonada.

   No interior da fábrica, Yo-Lanadi (Yo- Landi Visser) pronuncia o nome de uma série de objetos e até um rato que estão em cima de uma mesa de centro tentando ensinar Chappie (Sharlto Copley) a reconhecê-los enquanto Amerika (Jose Pablo Cantillo) faz piada sobre a ação de Yo-Landi.

   Chappie começa a repetir os nomes e quando Yo-Landi diz a Amérika que Chappie é esperto Chappie começa a imitar também cada ação dos dois.

   Gradualmente, vemos Chappie passar de uma repetição mais automática de palavras para a repetição subjetiva de parte de gestos e expressões enquanto a cena vai alternando planos gerais e médios gerando aproximações e distanciamentos quase didáticos.

   Ouve-se o barulho do carro de Deon Wilson (Dev Patel), e Amerika se levanta, saca a arma e vai verificar quem estava se aproximando.

   Ao perceber quem era, ele ri para Yo-Landi enquanto Deon chega com uma série de outros objetos para fazer o mesmo que Yo- Landi acabara de fazer. Chappie, no entanto, comporta-se como um membro da gang e Deon da uma bronca em Chappie tentando ensinar que aquele comportamento não é adequado. Aqui a relação moral da tensão cultural entre os personagens se estabelece.

   Eles saem do prédio. Deon propõe a Chappie que exercite sua criatividade e tente desenhar a sucata de um carro que está próximo a eles em uma tela com tinta em um cavalete. Vincent que estava espionando a movimentação percebe que Deon usou a chave de segurança da empresa e reprogramou Chappie. Vincent observa Deon ensinando Chappie a pintar e acha aquilo muito estranho, mas volta para a Tetravaal (empresa que construiu Chappie e onde Dean e Vincent trabalham).

   No caminho, cruza sem se perceber com Ninja. Este cruzamento entre os dois personagens que não se conhecem marca a metade da sequência e modifica o clima da ação. Ninja tem ainda uma terceira pretensão educacional para disputar com as de Deon e as de Yo-Landi. Ninja quer um robô assassio.

   Ao chegar vê Chappie pintando e acaba com a “brincadeira”. Ninja derruba Deon atira e quase acerta ele. Deon sai correndo para fugir de Ninja. Yo-Landi protesta quanto as intenções de Ninja entendendo que Chappie não é um robô burro mas que pode ter consciência. Ninja não concorda com Yo-landi e não dá a mínima para as preocupações de Yo-Landi. Tenta convencer Chappie dizendo a ele que esse não é o mundo real e propõe mostrar qual é esse mundo real.

   Chappie entra empolgado no furgão e é levado por Ninja e Amerika para conhecer o mundo real.

   Essa empolgação tem um apelo emocional contraditório à ação seguinte: Ninja para em um terreno baldio onde algumas pessoas estão reunidas. Ao perceberem Chappie todos se assustam, mas Ninja coloca Chappie para fora do carro e, ao ser deixado para traz, Chappie tenta voltar para a Van. Ninja acelera o carro e as pessoas percebem que Chappie não parece tão amedrontador quanto os outros robôs policiais.

   Todos começam a empurrar Chappie que se comporta como uma criança assustada.

   Neste ponto da trama toda a identificação que temos com Chappie ganha força em uma estrutura narrativa denominada estrutura de agressão.

   Reconhecemos Chappie como uma criança em fase de aprendizagem e nessa parte final somos levados a assistir o que subjetivamente tomamos com o linchamento de uma criança.

"Não importa o grau de consciência crítica do espectador para que , sentado dentro de uma sala escura, subitamente só diante da tela, fique inteiramente à mercê do realizador, que passa a poder violenta-lo a qualquer momento e por qualquer meio. Se o espectador for exposto ao máximo de dor, em vão ele acionará seus mecanismos de defesa, em vão ele se lembrará de que é apenas um filme (...)

“Será sempre tarde demais: o “mal” estará consumado e o mal-estar, até mesmo o terror, terão tomado conta dele.”, (NOËL, 1932), p. 152

 

   Essa sensação é reforçada e levada às últimas consequências. Além da expressão corporal e das falas de Chappie reforçarem o medo, o diretor insere imagens em planos subjetivos utilizando efeito de textura entrelaçada e diferente do restante do filme.

   Dessa forma, naquela situação, “vemos o mundo real com os olhos de Chappie” o que intensifica o sofrimento do personagem. Além das subjetivas, a sequência termina com planos de câmera lenta onde Chappie é golpeado por uma garrafa de coquetel molotov nas costas, correndo e gritando que queria voltar para casa.

 

Filme: Chappie, (EUA/ México/ África do Sul, 2015)
Direção: Neill Blomkamp.
Roteiro: Neill Blomkamp, Terri Tatchell
Elenco: Sharlto Copley, Dev Patel, Ninja, Yo-Landi
Visser, Jose Pablo Cantilo, Hugh Jackman, Sigourney
Weaver, Brandon Auret, Anderson Cooper.
Duração: 120 min.
Onde assistir: Netflix
Gênero: Ficção científica

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